BAKU – A declaração final da cúpula do G20 realizada no Rio mandou sinais positivos para a COP29 de que as 20 nações mais ricas do planeta estão cientes do seu papel de liderança no enfrentamento às mudanças climáticas e da necessidade de aumentar o financiamento climático de bilhões para trilhões de dólares. Mas falhou em pontuar especificamente um comprometimento com a transição para longe dos combustíveis fósseis.

Essa é a análise de especialistas em clima que acompanham as negociações na 29ª Conferência do Clima da ONU, que ocorre até o fim desta semana em Baku, no Azerbaijão. Para eles, foi positivo que os líderes tenham apontado, na declaração, um comprometimento com “negociações bem-sucedidas em Baku”, em referência ao principal objetivo da COP29, que é a definição de um novo mecanismo de financiamento climático – o chamado novo objetivo coletivo quantificado (NCQG, na sigla em inglês).

É preciso definir em Baku não só quem vai pagar para ajudar os países pobres a adotar medidas de redução de emissões – assim como a se adaptarem às mudanças climáticas que já estão acontecendo – como também quanto recurso vai ser colocado na mesa e como ele vai ser distribuído. 

Essa é a discussão mais complexa das conferências do clima, porque países em desenvolvimento querem que os desenvolvidos assumam essa conta sozinhos, visto que, historicamente, eles enriqueceram queimando combustíveis fósseis – justamente o que causou o problema que temos hoje: o aquecimento global. Os países ricos, por sua vez, defendem que há nações emergentes com a economia forte o bastante para também contribuírem de modo obrigatório, como a China e a Arábia Saudita. 

O impasse, porém, vai além, porque se pede não apenas um volume alto de recursos, mas também que uma boa parte disso seja repassada em forma de doação ou concessional (com juros muito baixos). Hoje parte dos recursos flui como empréstimos normais, o que causa endividamento dos países pobres. 

No item da declaração que trata da arquitetura financeira internacional, os líderes do G20 reafirmam o compromisso “de mobilizar coletivamente mais espaço fiscal e financiamento concessional para aumentar a capacidade do Banco Mundial de apoiar os países de baixa e média renda que precisam de ajuda para responder aos desafios globais, com uma estrutura clara para a alocação de recursos concessionais escassos e para fornecer um forte apoio aos países mais pobres”. 

Também houve apoio à taxação dos bilionários, o que é bastante defendido como algo que pode trazer mais justiça e funcionar como uma fonte adicional de recursos para o combate à crise do clima.

Especificamente no capítulo sobre ação climática, os países dizem reconhecer “a necessidade de catalisar e aumentar os investimentos de todas as fontes e canais financeiros para suprir a lacuna de financiamento das transições energéticas globalmente, especialmente nos países em desenvolvimento”. Que essas nações precisam ser apoiadas em suas transições para emissões de baixo carbono e dizem: “Nós trabalharemos para facilitar o financiamento de baixo custo para esses países”.

A mensagem repercutiu logo cedo na COP29. O secretário-executivo da Convenção do Clima da ONU (UNFCCC), Simon Stiell, que também tinha pedido um sinal dos países ricos para a conferência, declarou: “Os líderes do G20 enviaram uma mensagem clara aos seus negociadores na COP29: não deixem Baku sem um novo objetivo financeiro bem-sucedido. Isso é do interesse claro de todos os países”.

Segundo ele, ao se comprometerem a “impulsionar reformas financeiras que coloquem uma ação climática robusta ao alcance de todos os países”, as nações ricas deram “um sinal essencial, em um mundo assolado por crises de dívida e impactos climáticos crescentes, que destroem vidas, desestabilizam cadeias de suprimentos e alimentam a inflação em todas as economias”.

E complementou: “As delegações do G20 agora têm suas diretrizes para Baku, onde é urgente que todas as nações superem a postura política e avancem rapidamente em direção a um terreno comum, em todas as questões”.

O que o G20 não trouxe, no entanto, é um comprometimento dos países mais ricos com a eliminação dos combustíveis fósseis, como destacado no ano passado no Consenso dos Emirados Unidos – o documento de encerramento da 28ª COP do Clima. O texto, que apresentou o primeiro Balanço Global (GST, na sigla em inglês) do Acordo de Paris, trouxe, pela primeira vez, uma menção a esse ponto, ao recomendar que os países façam a “transição para longe dos combustíveis fósseis”.

Na declaração do G20, os países dizem que subscrevem inteiramente o Consenso dos Emirados Árabes e o GST e dizem apoiar a implementação de alguns pontos apresentados no ano passado, como esforços para triplicar a capacidade de energia renovável globalmente e duplicar a taxa média anual global de melhorias na eficiência energética. Mas não trazem uma menção clara à “transição para longe dos combustíveis fósseis”.

De acordo com observadores, houve pressão da Arábia Saudita, cuja diplomacia foi apelidada pelo New York Times de adotar um “martelo da demolição“, para que isso não entrasse na declaração.

“Apesar do apoio geral ao trabalho em Baku, a ausência de um compromisso com a transição para longe dos combustíveis fósseis por parte dos países mais ricos e maiores emissores no comunicado final é impressionante e levanta sérias preocupações sobre como o mundo vai seguir com este resultado-chave do consenso dos Emirados Árabes Unidos alcançado no ano passado na COP28”, resumiu Stela Herschmann, especialista em política climática no Observatório do Clima, em comunicado à imprensa.

A repórter viajou a Baku a convite do Instituto Arapyaú e do ClimaInfo.

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