‘Com Nunes, periferias enfrentarão grandes desafios’, diz vereadora Amanda Paschoal

Por Jacqueline Maria da Silva

‘Com Nunes, periferias enfrentarão grandes desafios’, diz vereadora Amanda Paschoal

Os moradores das periferias de São Paulo e as minorias sociais que vivem na cidade – como a população feminina, negra e LGBTQIAP+ – devem ter perdas significativas com a eleição de Ricardo Nunes (MDB) para a prefeitura da capital paulista. Isso porque na gestão do emedebista os investimentos em cultura, saúde e trabalho tendem a ser reduzidos, tendo em vista seu primeiro mandato e as propostas de campanha.

A avaliação é da quinta vereadora mais votada de São Paulo, Amanda Pascoal (PSOL), 32, cria da periferia, mulher trans e negra. “Será um desafio maior para construir a oposição ao governo na Câmara, principalmente com a extrema direita dentro da Casa. Teremos que lutar para driblar retrocessos e discursos de ódio que estiveram presentes na campanha”, avalia.

Amanda visitou escola municipal Nelson Mandela e conversou com profisisonais da educação @Matheus Alves

Nascida do Jardim São Bernardo, zona sul, começou a ampliar sua educação política no cursinho popular Transformação. Mais tarde, ajudou a fundar o TRANSarau, coletivo que une cultura, arte e política, voltado para a valorização da população trans. 

Em 2021, trabalhou na campanha de Érika Hilton (PSOL) para deputada federal, primeiro como recepcionista de gabinete e depois como sua principal assessora de campanha. Com apoio da parlamentar, Amanda concorreu a vereadora nas eleições municipais de 2024 na capital paulista, conquistando uma votação expressiva, que ultrapassou os 100 mil votos.

“Ser uma mulher trans no Brasil já te obriga e te condiciona à militância, a trabalhar pela resistência e sobrevivência do nosso próprio corpo”.

A Agência Mural conversou com Amanda Paschoal para avaliar os desafios da próxima gestão e as perspectivas para as juventudes periféricas e LGBTQIAPN+. Confira o papo na íntegra:

Agência Mural: Você vislumbrava esse resultado?

Amanda Paschoal: Eu esperava ser eleita com um bom número, porque tive apoio da Erika [Hilton] e também pela transferência de votos, pela construção da minha imagem política, pela minha receptividade com as pessoas e pela construção com a minha própria base.

Mas não esperava estar entre os cinco mais votados ou ser a mulher mais bem votada de esquerda. Acabei tendo um resultado  grandioso, o que dobra a minha responsabilidade em dar continuidade ao legado da Érica, representando contraponto ao ódio tão presente na política e na nossa sociedade.

Amanda em campanha na periferia de São Paulo @Matheus Alves

AM: Levantamentos da Mural indicam que a representatividade foi um critério importante na escolha de candidatos, sobretudo entre mulheres negras, periféricas e LGBTQIAPN+. Como você avalia o resultado das eleições na capital paulista sob esse viés?

AP: Nós perdemos mandados importantes, como Quilombo Periférico, e não conseguimos eleger outras figuras importantíssimas do PSOL que concorreram ao pleito. Então acho que é um avanço ter essa expressividade de votos, mas ainda assim nós precisamos nos organizar e reelaborar [a forma] como a esquerda se comunica e responde a uma direita que se articula de maneira muito sagaz para cooptar a juventude. Precisamos conseguir a expressividade de votos e o crescimento que eles [políticos da direita] tiveram, para termos uma resistência maior dentro da Câmara. O cenário da atual gestão é bem menos desafiador em relação ao que vamos enfrentar a partir do ano que vem.

AM: Na sua avaliação, como será legislar com Ricardo Nunes (MDB) prefeito, pensando nas periferias?

AP: As periferias e todas as minorias da cidade terão uma perda grande, porque não existe compromisso com investimento em cultura, saúde e oportunidade de trabalho. Será um desafio maior para construir a oposição ao governo na Câmara, com o debate da extrema direita avançando dentro da casa. Será preciso driblar os retrocessos que serão pautados e o próprio discurso de ódio que esteve presente na campanha e vai estar presente neste cenário.

Amanda em atividades de valorização da cultura na capital paulista @Matheus Alves

AM: Quais outros desafios você espera enfrentar na próxima gestão, majoritariamente conservadora? Como está se preparando para isso?

AP: O primeiro dia na posse vai ser uma prévia de como as coisas vão se dar. O candidato mais votado [para a Câmara Municipal, Lucas Pavanato, do PL] tem pautas antitrans e antiLGBT. Esta legislatura elegeu uma direita mais identitária. Então eu acho que vai ser um desafio muito grande de construção de política, nos debates, no ambiente de trabalho e no plenário. Vamos ter muitos embates.

Mas eu tenho um trabalho para entregar para a cidade. Estou me preparando para desenvolver mais meu discurso, para me aprofundar ainda mais nos temas que defendo e para conhecer melhor meus adversários.

AM: Quais serão suas prioridades para as periferias?

AP: A defesa dos direitos humanos e a defesa da comunidade LGBT, que são algumas das minhas prioridades, naturalmente estarão comigo. Em relação a projetos, acredito que vamos conseguir alinhar no cenário [conservador] da Casa o combate à fome, que foi prioritário no mandato da Érica e é prioritário para mim. Também vamos pautar a defesa do meio ambiente, o combate ao racismo e a mitigação e adaptação às crises climáticas. Além disso, a atenção à população em situação de rua e o fortalecimento de projetos como das cozinhas solidárias serão prioridades.

Amanda recebeu apoio do candidato a prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL) @Matheus Alves

AM: O seu slogan de campanha é “Transformar São Paulo”. Qual a transformação que você deseja ver em quatro anos?

AP: Quero que reconheçam que nossa comunidade precisa de respeito, visibilidade e representatividade na elaboração das políticas. Não construímos política apenas para travestis, transexuais ou comunidade LGBT, mas temos consciência, empatia e conhecimento para construir políticas transversais, que contemplem as necessidades de todas as pessoas da nossa cidade.

Daqui a quatro anos, espero que a gente consiga avançar para uma cidade melhor, com mais possibilidades de articulação política e menos desigualdade. Quero uma cidade que não tenha a quantidade gigantesca de pessoas em situação de rua que temos, que valorize a cultura e os artistas periféricos, que ofereça educação de qualidade e saúde mental, principalmente nossas crianças, adolescentes e pessoas que estão vulneráveis aos discursos de ódio, racismo, machismo, gordofobia.

Agência Mural

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