Em Pernambuco, 95% das pessoas mortas pela polícia eram negras
Em um ano, Pernambuco registrou um aumento de 28,6% no número de mortes causadas pelas polícias. O estado saiu de 91 vítimas, em 2022, para 117 vítimas em 2023, é o que revela a quinta edição do boletim “Pele Alvo: Mortes que revelam um padrão”, divulgado pela Rede de Observatórios da Segurança.
O documento reúne dados de nove estados brasileiros: Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo. As informações do número de mortes provocadas pela polícia são obtidas através da Lei de Acesso à Informação (LAI) junto às Secretarias de Segurança Pública e outros órgãos dos estados.
O monitoramento revelou que, em 2023, pelo menos sete pessoas negras foram mortas pela polícia a cada dia. Ao todo, 4.025 pessoas foram vítimas de ações policiais. Destas, 2.782 eram pessoas negras – pretas e pardas – o que representa 87,8% do total. Ou seja, a cada quatro horas uma pessoa negra foi morta pela polícia nos nove estados que compõem o monitoramento.
Os dados revelam ainda que a juventude é a parcela da população mais vitimada pela letalidade gerada por ação policial — com a faixa etária de 18 a 29 anos concentrando a maior quantidade de casos. Entre os nove estados analisados, 243 dos mortos por policiais eram crianças e adolescentes de 12 a 17 anos.
Desde 2020, quando foi apresentado o primeiro Boletim pela Rede de Observatórios, o padrão das pessoas mortas por agentes de segurança estaduais se mantém, sendo a população jovem negra a grande maioria das vítimas.
Quase todas as pessoas mortas pela polícia em Pernambuco eram negras
A Rede de Observatórios da Segurança elaborou um gráfico, com dados das Secretarias de Segurança Pública e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que compara a proporção de negros na população dos estados com o percentual de negros mortos pela polícia. Confira:
De acordo com o levantamento, Pernambuco foi o estado que apresentou a maior proporção de pessoas negras vitimadas em ações policiais, com 95,7%. O boletim revela ainda que a cada quatro dias uma pessoa negra é morta pela polícia no estado.
Entre os nove estados monitorados pelo boletim Pele Alvo, Pernambuco foi o que registrou o maior aumento no número de mortes, com 28,6% vítimas a mais que em 2022. Além disso, o número de pessoas negras mortas pela polícia aumentou 41,0% de um ano para o outro. Ao todo, foram 117 óbitos registrados em 2023, o maior número desde 2019. Apenas no Recife o número de mortes provocadas por agentes de segurança quase dobrou – passando de 11, em 2022, para 20, em 2023 – e a juventude segue sendo a mais vitimada.
Pessoas que têm entre 12 e 29 anos representam 70,9% dos mortos pelas polícias em Pernambuco, com 83 óbitos. Destes, 98,3% são homens. Recife – 20 óbitos registrados – , Olinda – 13 óbitos registrados – e Jaboatão dos Guararapes – 10 óbitos registrados – concentram 36,8% do total de vítimas.
De acordo com dados da Secretaria de Assistência Social, Combate à Fome e Política sobre Drogas de Pernambuco, pelo menos 42% das mortes violentas intencionais no estado têm ligação com a “guerra às drogas”.
Há quase um ano, no dia 27 de novembro de 2023, a governadora Raquel Lyra lançou o programa Juntos Pela Segurança. Com um conjunto de metas e ações – entre elas a contratação de novos profissionais de segurança através de concursos – e com um investimento bilionário, a governadora garantiu “a redução de 30% da criminalidade até o ano de 2026”.
No boletim Pele Alvo, a Rede de Observatórios da Segurança enfatiza que “mesmo com o lançamento do Programa Juntos pela Segurança, cujo objetivo seria reduzir crimes em até 30%, não é isso que os dados apresentam”.
“É preciso investir nas políticas de inclusão social, o que exige uma abordagem multidimensional, que envolve o combate à desigualdade social, a melhoria na educação, a saúde, emprego e moradia nas áreas mais afetadas pela violência. Então, o próprio programa [Juntos Pela Segurança] precisaria estar alinhado com políticas públicas de inclusão social, que ofereçam alternativas à população, principalmente à juventude negra, para que não seja atraída para atividades criminosas”, defende Dália Celeste, pesquisadora e integrante da Rede de Observatórios da Segurança em Pernambuco.
“Garantir que os casos de abuso de autoridades sejam investigados e punidos também é fundamental para interromper esse ciclo da própria violência. Então, assim, a criação de ouvidorias independentes que possam monitorar as ações policiais é uma medida importante para garantir a maior responsabilidade no uso da força, da força desses agentes de segurança”, concluiu Dália Celeste.