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Quando terminei a coluna da semana passada, já tinha na cabeça o tema do texto desta semana. Imaginei que estaria discutindo aqui a definição de um tratado inédito, e extremamente necessário, para limitar a poluição plástica no mundo. Esse era o objetivo de uma reunião, no âmbito da ONU, que foi realizada por uma semana, até o último domingo, na Coreia do Sul. Só que os países falharam em chegar a um acordo sobre isso, estragando parcialmente meus planos aqui.

Já deveria ter esperado por esse desfecho. Apesar de os países virem negociando desde o início do ano – a reunião na Coreia foi a quarta e (seria a) última em torno da tentativa de estabelecer esse tratado –, a realidade é que eles estavam debatendo um problema de dificílima solução, talvez até mais complicado do que eliminar os combustíveis fósseis, cuja queima é a principal causa do aquecimento global.

Em primeiro lugar, porque os dois problemas estão diretamente relacionados, afinal, os plásticos são produzidos a partir do petróleo. Em segundo, porque os plásticos são tão onipresentes nos nossos modos de vida que estão até mesmo dentro dos nossos corpos. Não só os nossos, aliás, mas os de diversas espécies que não têm nada a ver com isso. Como conta a colega Isabel Seta em reportagem da Pública, o plástico, “em suas formas microscópicas, já foi detectado em órgãos humanos e até no sangue e no leite materno”.

O grande problema é que a maior parte do plástico é de uso temporário e é descartado logo depois. De acordo com levantamento do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), das mais de 9,2 bilhões de toneladas geradas desde a década de 1950, sete bilhões viraram lixo. 

Como explica a mesma reportagem, o objetivo era tentar definir um tratado internacional, com poder de lei, que abordasse todo o ciclo de vida dos plásticos – da produção e design ao descarte. Esperava-se que fosse possível concordar em planos para reduzir, por exemplo, a quantidade de plásticos de uso único e listar substâncias químicas tóxicas que precisariam ser banidas. 

Mas muitos países (obviamente os produtores de petróleo) argumentaram nas negociações que resolver a poluição plástica é uma mera questão de resolver o lixo. Não seria necessário diminuir produção e consumo, só melhorar a reciclagem. Certo… O fato é que, diante do impasse, um acordo não saiu. Ficou para o ano que vem a retomada dos esforços nesse sentido.

Foi mais um revés desanimador em um ano marcado por poucos avanços nas tentativas globais de lidar com grandes problemas ambientais. As conferências do clima e da biodiversidade da ONU também terminaram com resultados bem aquém dos necessários. 

O pior de tudo é a mensagem que isso passa para o mercado. Nesta segunda-feira (2), um dia após o fim da reunião mal-sucedida na Coreia, a Coca-Cola já anunciou que estava desistindo dos seus planos de reduzir o uso de plástico e de fazer o reuso. A empresa, de acordo com um estudo publicado em abril na revista Science Advances, responde por 11% da poluição plástica com marca do mundo. A alegação da empresa foi a de que ela “enfrenta desafios complexos” e que o foco agora seria usar mais material reciclado.

Pois é. Complexos os desafios são mesmo. Mas não lidar com a poluição agora só aumentar o dano e tornar a solução do problema muito mais cara depois.

Congresso brasileiro na contramão ambiental

Não é somente no âmbito internacional, no entanto, que as discussões legais não estão alinhadas com a urgência dos desafios das mudanças climáticas e da degradação do meio ambiente. Internamente, no Congresso brasileiro, diversos projetos também avançam na contramão da proteção ao planeta. 

É o caso da regulamentação da Reforma Tributária; da Proposta de Emenda à Constituição que extingue os terrenos de marinha, popularmente conhecida como “PEC da privatização das praias” (que voltou a tramitar nesta semana); e do projeto de lei que visa criar um marco regulatório para as eólicas offshore. 

A Reforma Tributária, que poderia ser um caminho para aumentar impostos de produtos poluentes e danosos ao meio ambiente, e diminuir aqueles que ajudam na preservação, está perigando fazer o contrário.

Uma análise divulgada nesta semana pelo Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio), pelo Instituto Socioambiental (ISA) e pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) apontou que o projeto em tramitação no Senado (PLP 68/2024) pode aumentar em até sete vezes a alíquota do imposto para produtos da sociobiodiversidade, como o açaí e a castanha-do-pará. 

De acordo com as organizações, sem uma menção específica de isenção ou desconto, itens da sociobiodiversidade produzidos por povos indígenas, quilombolas, extrativistas e agricultores familiares podem ficar com alíquota cheia, de até 27,97%. Hoje a alíquota mínima praticada sobre o açaí é de 3,65%, considerando empresas no regime Simples Nacional e com isenção do ICMS.

Por outro lado, a reforma prevê que os agrotóxicos podem ter uma isenção de 60%. 

Ainda segundo a análise, a concessão de benefícios fiscais a esses produtos da sociobiodiversidade teria um impacto fiscal mínimo de apenas 0,046% sobre a arrecadação nacional. A discrepância é digna de nota porque hoje se entende que é justamente a valorização de produtos da floresta que vai trazer alternativas econômicas à Amazônia e ajudar a zerar o desmatamento – meta do governo até 2030.

Havia a expectativa de que a proposta do relator, o senador Eduardo Braga (MDB-AM), seria apresentada nesta semana, mas foi adiada para a próxima.

Outro projeto que poderia ser um grande avanço ambiental, mas pode virar um pesadelo é o das eólicas offshore (PL 576/2021). Seu objetivo é definir um marco legal para o estabelecimento desses geradores de energia a vento no mar, medida considerada fundamental para alavancar a produção de hidrogênio verde no país, um combustível mais limpo, que pode ser uma alternativa aos combustíveis fósseis. 

Só que foram colocados alguns “jabutis” no texto que não têm absolutamente nada a ver com energia limpa – muito pelo contrário. O texto, que está para ser apresentado na Comissão de Infraestrutura do Senado desde a semana passada, inclui a obrigatoriedade de contratação de usinas térmicas a gás natural, que funcionariam até 70% dos dias do ano, e estende a vida útil de térmicas a carvão da região sul de 2028 para 2050. 

Um estudo feito pela Coalizão Energia Limpa calcula que o funcionamento dessas térmicas resultará em emissões extras de 274,4 milhões de toneladas de CO2 nos próximos 25 anos. O estrago é tão grande que anularia os ganhos de redução de emissão do país que tivemos com a queda do desmatamento na Amazônia nos últimos dois anos. Fora os custos de uma geração elétrica a combustível fóssil, que serão repassados a todos os consumidores.

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