Com a aproximação da COP30 — a principal conferência da ONU sobre mudanças climáticas — marcada para novembro de 2025, em Belém (PA), aumentam as expectativas e a urgência em torno do debate climático.

Pela primeira vez sediado na Amazônia, o evento reunirá líderes do mundo todo para negociar soluções frente à crise do clima. E, neste cenário, o protagonismo de jovens ativistas ganha ainda mais força, inclusive os vindos das periferias.

Ao menos 24 deles foram selecionados e são finalistas do PYCC (Presidency Youth Climate Champion), ou Campeão Climático da Juventude. Apenas um dos nomes indicados será escolhido pelo Governo Federal para representar oficialmente as pautas climáticas das juventudes durante as negociações.

Criado para garantir a participação ativa das juventudes durante a conferência, o programa recebeu 154 inscrições em uma chamada pública, com candidaturas de todas as regiões do Brasil. A presença feminina se destacou, representando 62% do total.

Dos finalistas, muitos se destacam não apenas pelo ativismo ambiental, mas por representarem favelas e povos indígenas — grupos que vivenciam em primeira mão os efeitos da crise climática.

Jahzara, ativista climática que estará na COP30 @Léu Britto/Agência Mural

Jahzara Ona, 20, é ativista climática e estudante de Geociências e Educação Ambiental pela USP (Universidade de São Paulo). Moradora do Jardim Pantanal, em São Miguel Paulista, na zona leste de São Paulo, ela é um exemplo da importância da representatividade nos espaços de decisão sobre o clima.

‘A comunidade onde moro não se chama ‘Pantanal’ por acaso. Tem um histórico de enchentes, e essa preocupação esteve presente desde as minhas primeiras ações como ativista’

Jahzara, ativista climática

Para ela, a crise climática não é algo abstrato — é uma realidade concreta que afeta diretamente a comunidade. “Esse é um cargo de incidência política muito grande e, a partir dele, eu poderia representar não apenas a minha comunidade”, reforça.

Essa mesma urgência se reflete em outras histórias de jovens que cresceram em territórios marcados pelos impactos da crise climática — e que hoje transformam essas vivências em ação política e mobilização coletiva.

Cofundadora do Periferia Sustentável, Mahryan está entre as selecionadas @Arquivo Pessoal

Mahryan Sampaio, 24, por exemplo, atua em temas como as mudanças climáticas e transição energética, além de ser cofundadora e diretora de Incidência Política do Instituto Perifa Sustentável, que mobiliza juventudes para a construção de uma agenda socioambiental justa e inclusiva.

“A minha luta é pela construção de um futuro mais justo e sustentável, onde as comunidades periféricas possam ser parte ativa da mudança”, afirma.

Nascida no Rio de Janeiro e criada na zona norte de São Paulo, ela representou o Brasil como delegada jovem na Cúpula do G20, realizada no Rio — um encontro das 20 países com as maiores economias do mundo para discutir temas como clima e desenvolvimento.

Protagonismo juvenil nas periferias

A crise climática já afeta profundamente crianças e jovens — especialmente os que vivem em territórios vulneráveis. Segundo um relatório do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), cerca de 40 milhões de meninas e meninos no país estão expostos a múltiplos riscos climáticos e ambientais, comprometendo direitos básicos como saúde, educação e moradia.

A COP30, que será realizada pela primeira vez na história na Amazônia brasileira, acontece em um território marcado não só pela biodiversidade, mas também pela juventude da população.

De acordo com o IBGE, a região Norte é a mais jovem do país: 25,2% da população tem até 14 anos, seguida pelo Nordeste, com 21,1%.

Estudante de Engenharia de Energias Renováveis (UFPB) e ativista climática, Mikaelle Faria é diretora regional do Palmares Lab-Ação e voluntária do Fridays for Future João Pessoa @Mikaelle Farias/Divulgação

É nesse contexto que surgem vozes como a da paraibana Mikaelle Farias, 23, uma das jovens indicadas ao PYCC. Ela está prestes a participar de sua quinta COP e desabafa sobre como esses espaços ainda precisam reconhecer o protagonismo das juventudes.

“Quando as conferências de clima foram criadas, elas não consideraram a participação de crianças e jovens, nem a importância de nossas vozes para a construção de soluções.”

A estudante de Engenharia de Energias Renováveis pela UFPB (Universidade Federal da Paraíba), Mikaelle também é diretora regional do Palmares Lab, uma organização que promove inovação e justiça climática a partir das vivências da juventude negra e periférica.

“Eu tenho 23 anos e não quero herdar a crise climática — e se o sistema não nos vê, que sinta o impacto da nossa presença”, comenta.

Reconhecida pela Exame como liderança jovem na COP28, Marcele entregou a Lula proposta para participação da juventude na política climática e cobrou a criação de um Conselho Jovem de Clima @Reprodução Redes sociais

Outro nome indicado que fortalece esse debate é Marcele Oliveira, 25, jovem ativista de Realengo, na periferia do Rio de Janeiro.

Formada em Produção Cultural pela UFF (Universidade Federal Fluminense), Marcele busca a preservação do Parque Realengo Verde — uma área ameaçada pela especulação imobiliária que se tornou símbolo de resistência a partir da Ocupação Parquinho Verde, com atividades culturais e ambientais no território.

“Foi ali que entendi como a relação com o meio ambiente pode mudar a forma como compreendemos nossos bairros” comenta

Além da poluição, enchentes e calor extremo, Marcele destaca a ausência de áreas verdes e de articulação comunitária como entraves para uma vida digna nas favelas. Para ela, a crise climática vai além da responsabilidade individual — exige políticas públicas e mobilização com protagonismo dos territórios mais afetados.

“A gente costuma responsabilizar o que está visível — prefeitura, lixo, o vizinho —, mas esquece que a crise vem de decisões distantes que impactam diretamente nosso dia a dia”, pontua.

Uma publicação compartilhada por Centro Brasileiro de Justiça Climática (@cbjc_br)

A ativista carioca também chama atenção para os obstáculos enfrentados pelas juventudes brasileiras na preparação para a COP30 — desde a falta de hospedagem e transporte até a exclusão nos espaços de articulação.

“A articulação ainda é muito nichada e não contempla quem mais precisa estar nos debates. Para a COP30 ter impacto real, precisa ser o mutirão que o presidente propõe — mas um mutirão protagonizado por quem sente os impactos da crise no dia a dia”, afirma.

Sobre o futuro da liderança escolhida no PYCC, ela reforça que representatividade e articulação com os territórios precisam caminhar juntas:

“Esse cargo precisa ser liderado por uma pessoa negra e que, independente de onde venha, tenha articulação com os biomas do Brasil. Mais do que um cargo, é uma liderança capaz de formar um time que represente diferentes realidades do país.”

Ativista indígena do povo Terena. Atua na defesa dos direitos dos povos originários e no fortalecimento de lideranças jovens no Mato Grosso do Sul @ Taily Terena/Divulgação

Apesar de a COP30 ocorrer na Amazônia, região majoritariamente jovem, a presença indígena entre os finalistas ainda é limitada. Apenas dois jovens indígenas foram indicados: Taily Terena, 31, antropóloga e ativista do povo Terena no Mato Grosso do Sul, e Walelasoetxeige Suruí, Txai Suruí, 28, do povo Paiter Suruí, em Rondônia.

Ativista e liderança do povo Paiter Suruí. Txai é a primeira indígena a discursar na abertura da COP26, com atuação destacada na defesa da Amazônia e dos direitos indígenas @Txai Suruí/Divulgação

Coordenadora e fundadora do Movimento Juventude Indígena de Rondônia, Txai atua na articulação e no fortalecimento de jovens indígenas no estado. Ela tem levado a pauta dos povos originários a espaços nacionais e internacionais, e destaca a importância de ampliar a representatividade indígena na COP.

‘Fico muito feliz de ter a possibilidade de talvez representar o nosso país como amazônida e mulher indígena

Txai, liderança do povo Paiter Suruí

As candidaturas habilitadas serão encaminhadas à Presidência da COP30 no Brasil, sob responsabilidade do embaixador André Corrêa do Lago, que fará a escolha final. A Secretaria Nacional de Juventude informou que haverá outras formas de participação das juventudes durante a conferência, com detalhes a serem divulgados no site oficial do governo.

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