Que quem visite a biblioteca do CEU Parque do Carmo, na zona leste de São Paulo, possa conhecer a história de uma importante moradora da região: Maria Pereira de Holanda (1928 – 2020). Esse é o desejo de pelo menos 200 moradores do Jardim Nossa Senhora do Carmo que participaram de um abaixo-assinado para nomear a biblioteca em homenagem à Maria Holanda.

Uma delas, responsável por articular a reivindicação, foi a professora de educação infantil Maria Lúcia Rocha, 62. “O nome dela sempre foi ventilado e surgiu a ideia de colocar na biblioteca, porque é um espaço de convivência, de participação, que é a cara dela”, conta.

A líder comunitária chegou na região no início dos anos 1970, quando ainda não havia água encanada, energia elétrica e posto de saúde no local. Ela então arregaçou as mãos e mobilizou vizinhos para exigir que o poder público implantasse serviços públicos de qualidade no bairro.

Quem se lembra bem do trabalho é a enfermeira Ângela Maria Rufino da Silva, 57, filha de Maria de Holanda. “Ela começou a vender cosméticos e a ter contato com muitas pessoas e viu que não tinha muitas melhorias aqui no bairro. Aí foi atrás disso. O negócio dela era a saúde, garantir saúde para o povo”, conta.

Junto com outros moradores, Maria de Holanda conseguiu que freiras enfermeiras do Hospital Santa Marcelina, na Vila Carmosina, zona leste, passassem a atender em um posto de saúde improvisado em uma antiga casa na Igreja São José Operário, no Jardim Nossa Senhora do Carmo.

A costureira aposentada Antônia Rocha, 73, que é irmã de Maria Lúcia, esteve na luta para garantir acesso à saúde no bairro. Ela se lembra bem de como era estar junto com Maria de Holanda. 

Antônia Rocha e Maria Lúcia Rocha lutam pelo nome de Maria de Holanda no CEU Parque do Carmo @Gabriela Vasques

“A gente lutava muito pela saúde e a gente acompanhava tudo para aprovar as nossas reivindicações”, conta Antônia, mais conhecida como Toninha, ao lembrar de passeatas e mobilizações que participou ao lado de Maria de Holanda.

As irmãs Toninha e Maria Lúcia chegaram no Parque do Carmo na mesma época de Maria de Holanda. Para elas, batizar a biblioteca com o nome da falecida moradora significa valorizar a memória da região. “Lembrar as pessoas dessa forma é manter a história do território viva”, afirma Maria Lúcia. 

Frutos da luta

O grupo formado por Maria de Holanda, Maria Lúcia, Toninha e outros vizinhos pressionaram a prefeitura e o governo do estado pela instalação de serviços básicos no bairro. “Conseguimos água encanada, luz elétrica, asfalto, posto de saúde e ônibus que passa aqui no bairro”, diz Ângela.

Outra conquista importante foi a desativação do Aterro Sanitário São Mateus, que foi construído próximo ao Parque do Carmo em 1984 e afetava diversos bairros próximos. “Era um mau cheiro… mas conseguiram tirar o lixão e levar para outro lugar”, lembra Ângela. 

Angela e seu marido Roberto Carlos lembram de diversos momentos que viveram com Maria de Holanda @Gabriela Vasques

Seu marido também se envolveu na luta da sogra e ajudou até o final da vida de Maria de Holanda. “A vida toda ela foi envolvida e preocupada para trazer melhorias”, afirma o advogado Roberto Carlos da Silva, 57.

Ele lembra que Maria de Holanda era preocupada e se posicionava sobre a importância de fazer valer os direitos das mulheres. “Mesmo que ela tenha vivido bem com o marido, sabia que [muitas] mulheres vivem uma vida difícil e nunca aceitou essa condição”.

Em memória

Uma das últimas mobilizações de Maria de Holanda foi pela construção de uma creche. A ideia era que ela fosse instalada em um terreno próximo a casa onde viveu. A obra foi cotada, mas não aprovada pela prefeitura devido às condições inapropriadas do solo.

Ela também cobrou autoridades para que as obras do CEU Parque do Carmo fossem concluídas e conseguiu vê-lo pronto pouco antes de falecer, em 2020. “Acho que quando ela morreu foi meio que a síntese, fechou com o CEU, que é um equipamento tão importante para a cidade”, avalia Maria Lúcia.

Maria de Holanda nasceu em 16 de junho de 1928 e faleceu em casa aos 92 anos, no dia 30 de outubro de 2020, vítima de complicações pulmonares. O velório também foi em casa e arrastou dezenas de pessoas, apesar da pandemia. Ela deixou 10 filhos, 31 netos, 20 bisnetos e 2 tataranetos, além de um legado de luta pelo bairro.

A proposta e o abaixo-assinado para que a nomeação da biblioteca aconteça está em tramitação na Câmara Municipal de São Paulo, com apoio do vereador Manoel Del Rio (PT). Os entrevistados acreditam que a autorização para homenagear Maria de Holanda deva ser oficializada nos próximos meses, em uma cerimônia.

A Agência Mural continuará acompanhando a história.

Agência Mural

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